19Fev
Padarias artesanais são oportunidade de negócio para empreendedores
O cheirinho de pão assando em uma casa na Vila Romana, zona oeste de São Paulo, costumava chamar a atenção dos vizinhos, que começaram a perguntar às ocupantes do imóvel quando eles poderiam experimentar os produtos.
Dentro da casa, funcionava desde abril de 2018 a Aleguà Pães Artesanais, que fornecia para hamburguerias, restaurantes e eventos corporativos diversos tipos de pães feitos sem aditivos ou conservantes, utilizando fermentação natural.
“Era tanta gente perguntando que resolvemos abrir as portasâ€, conta Carla Santos, sócia da padaria, que passou a atender o público em janeiro. Vinda do setor publicitário, Carla se uniu a Alessandra Guimarães, que já produzia há quatro anos em pequena escala, a partir de uma cozinha compartilhada. “Hoje a Alessandra cuida da cozinha e eu cuido do restanteâ€, diz.
A abertura da loja e a expansão da produção foram passos muito bem planejados. Em um mercado que valoriza a qualidade e o cuidado com os produtos, dar um salto grande demais é um risco para o negócio. “Não quisemos apostar todas as fichas na padaria de uma vez, já temos nossos clientes fixos. Vamos até servir um cafezinho, mas por enquanto precisamos ter retorno. O investimento na casa foi muito grandeâ€, conta Carla.
Outra mudança foi em relação à s entregas: antes, eram elas quem levavam os produtos aos clientes. Hoje, precisaram terceirizar a entrega. “A logÃstica com alimentos é muito difÃcilâ€, diz a empreendedora. Por essas questões do dia a dia do negócio, Carla e a sócia têm em mente que não podem crescer demais para não perder o caráter artesanal da padaria – o que inclui atendimento próximo e personalizado.
“Um dos desafios de empreender é que cada hora surge uma coisa nova para correr atrás. E também é preciso muito cuidado para manter uma sociedade, principalmente no começo, quando ainda estamos pagando a contaâ€, observa.
Expansão
O mercado de padarias artesanais e de pequenos produtores de pão passa por um momento de expansão, especialmente na cidade de São Paulo. Voltado para um público interessado na origem dos ingredientes e no modelo de produção, e disposto a investir um pouco mais no pão de cada dia, o alimento de casca mais dura e miolo aerado ganha espaço até nas gôndolas de redes de padaria.
“A chamada ‘saudabilidade’ é uma tendência no setor de alimentaçãoâ€, explica a consultora do Sebrae-SP Michelle de Melo Santos. “Os consumidores estão buscando alimentos com fermentação natural, com farinha orgânica, cereais e produtos funcionais, buscando menos desperdÃcio e valorizando produtores locaisâ€, diz.
Para o responsável pelo marketing da Sampapão (associação que reúne as empresas de panificação de São Paulo), Antônio Saú Rodriguez, a fórmula é clara: “O futuro da panificação, na verdade, é o passadoâ€. Embora a entidade ainda não tenha feito pesquisas especÃficas sobre padarias artesanais, ela investe em qualificação para seus associados nesse tema. “Há uma clientela das classes A e B que procura padarias pequenas ou mesmo quem não tem padaria. Nosso foco é incentivar que todo segmento possa participar disso e oferecer pães de fermentação natural, pães rústicosâ€, afirma.
Mas para quem resolve sair da panificação como hobby e se profisssionalizar, manter o equilÃbrio entre crescimento e as caracterÃsticas artesanais dos pães é um dos maiores desafios. “Esse produto é mais caro porque a matéria prima é mais cara, exige um tempo de preparação maior, fermentação longa. É difÃcil produzir em grande escala, e o custo dessa produção pode se tornar um problemaâ€, diz Michelle, do Sebrae-SP. Para ela, como um dos principais custos do negócio é o valor do aluguel, uma boa saÃda é procurar uma cozinha compartilhada.
Crescimento "slow"
O músico Ramiro Murillo começou a produzir pães artesanais há cerca de dois anos na edÃcula de sua casa, no bairro da Pompeia, em São Paulo. Interessado por gastronomia e disposto a investir nessa área, aprendeu as técnicas de fermentação natural com um amigo e começou a fazer testes. “Quando experimentei um pão de fermentação natural pela primeira vez, senti que era diferente. A qualidade era melhor, a digestão era melhor. Foi uma realização muito grande quando vi meu primeiro pão dar certoâ€, lembra.
O sucesso dos pães de Murillo deu inÃcio à s primeiras encomendas, mas o seu negócio, El Panadero, começou para valer mesmo em agosto de 2017. Para isso, ele reformou a edÃcula, instalou um forno profissional e passou a produzir fornadas duas vezes por semana. Não há uma loja fÃsica, e todo o contato com os clientes é feito por whatsapp. A qualidade dos seus pães foi reconhecida até pela Folha de S.Paulo, que os incluiu em uma publicação como os melhores de São Paulo.
“Minha produção é pequena mesmo, são cerca de 60 pães por semana. Por enquanto não pretendo ter um espaço fÃsico para receber os clientes, mas quero chegar a 100 pães por semana e estou pensando em contratar um assistenteâ€, diz Murillo. Dois motoboys em dias fixos são responsáveis por 80% das entregas, e o restante é retirado no local pelos clientes.
Recentemente, ele adquiriu maquinário novo e está pensando em investir em mais um fogão e uma geladeira. “No slow food o crescimento também precisa ser slow (lento). Se eu dobrar a produção, eu quebro. O valor humano está agregado: o pão é você, não basta apenas ser um empreendedor que vai investir dinheiro. Em larga escala, o fator humano se perdeâ€, diz Murillo, que ainda continua trabalhando com música em parte do tempo.
De acordo com ele, a concorrência entre as padarias ainda é pequena em relação à demanda crescente. Metade da divulgação de seus produtos é feita pelo boca a boca, a outra vem das redes sociais e do site da empresa. “O Instagram é hoje uma ferramenta de divulgação muito forte na gastronomia, mas ter um site é fundamental. O site dá credibilidade e consistência, mostra onde estou localizado, conta minha históriaâ€, afirma. Para a consultora Michelle, esse valor que o produto artesanal traz consigo deve ser transmitido ao cliente. “Os funcionários precisam estar aptos a explicar o que está sendo vendido, quais são os ingredientes. E não é porque o produto é artesanal que não deve ser padronizado, com o mesmo tamanho e peso. É muito importante contar a história do produto e sempre ser verdadeiro nas informaçõesâ€, diz.
Fonte: PEGN
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